domingo, 18 de janeiro de 2009

Telegrama


Ainda estava pregada em sua cama quentinha quando ouviu um barulho na rua. Demorou a entender a gritaria. Com a boca colada no travesseiro, se perguntou baixinho se tinha jogo do Brasil, corrida ou se era festa junina.

Alguns segundos mais foram necessários para Luíza entender que ainda era setembro, que não tinha jogo nem corrida e que, pior, era seu aniversário.

- Saco. Diazinho de merda. Foda-se que eu nasci há uma caralhada de anos.

Ainda assim, demorou a se atentar para a razão do furdúncio lá fora.

- Luíza Maria, vem aqui fora que nóis tem um recado de alguém que te ama muito.

Antes fosse um pesadelo. Luíza Maria resolveu fingir que não era com ela. Mas as vozes continuavam e a mestre da cerimônias grotesca insistia enquanto assassinava o português.

- Luíza, vem cá logo. Ou você quer que a gente entra, hein? Nóis veio aqui só por você. Foi o Edemar quem contratou nóis pra fazer dessa sua manhã um momento de magia encantada.

Não restava outra opção. Ou ela saía ou ela saía.

- Olha gente, é ela vindo aí! êêêê! Vamo bater palmas pra aniversariante!

A caminhada lenta e a expressão pesada de Luíza foram transformando a alegria contagiante da trupe bizarra em um constrangimento geral. Até os vizinhos curiosos, que desfilavam com seus pijamas na calçada, ficaram em silêncio.

Com cara de poucos amigos, poucos não, com cara de amigo nenhum, Luíza ficou parada na porta. Com uma das mãos tapava o sol. A outra estava apoiada sobre a cintura. Deu alguns passos e falou para a oxigenada que a acordou.

- Presta atenção. Eu odeio esse tipo de telegrama. Dá pra ir embora? Se não por mim, pelo amor de deus?

Virou-se pra Edemar e terminou.

- Porra, Edemar, isso tinha que ser coisa sua, né?
- Gostou?
- Olha minha cara de alegria.
- Parece alegria não.
- Claro que não, porra.
- Então não gostou?
- De qual parte? Das bexigas em formato de poodle? Dessa bandinha fedida? Da cabeça de Mickey no corpo do pica-pau? Ou dessa analfabeta com cara de candidata a big brother?

A multidão ficou em silêncio por uns segundos. Ouviam apenas a bandinha que continuava, ainda que bem baixinho, tocando Como uma Deusa. Luíza estava certa de que havia conseguido expulsar todos dali. Mas uma risada comunitária ensurdeceu a multidão.

-Eu tô falando sério, num é pra rir. Edemar, é assim que você quer voltar pra mim? Você vai conquistar é meu ódio desse jeito. Telegrama animado já é um horror. Mas esse daqui. Isso é o portal do inferno. Furreca até o talo, vamos lá, convenhamos.
- Eu não conhecia nenhum. Achei esse no catálogo.
- Você devia ter ido na letra T, de telegrama, e não na A, de aberrações.

Enquanto os vizinhos se esbaldavam de rir, os integrantes do telegrama foram saindo de fininho.

- Olha isso. Você espantou eles. São trabalhadores, Luíza. Acordaram cedo pra chegar aqui antes de você acordar.
- Se chegassem aqui meio-dia eles ainda iam me acordar, Edemar. Agora eu sou a vilã, é? Ó, Edemar, some que eu quero ficar sozinha. Além do que tá na hora do meu cocô da manhã. Gente, desculpa o tumulto, viu? Da próxima vez prometo que não falo nada. Jogo uma bomba logo.

E mais uma vez a multidão respondia com risadas.

Edemar foi embora direto pro bar, tomar uma cachaça. Se antes tinha que esquecer Luíza , agora tinha que esquecer a humilhação toda.

Quando entrava em casa, Luíza ouviu alguém gritando por ela.

- Ei!

Virou e lá estava um dos membros da bandinha, com uma roupa uns três tamanhos maior que ele. Tinha ombreiras douradas com uma franjinha encardida. Os botões eram grandes e cheio de rococós. Luíza deu uma manjada no rapazinho e mandou:

- Que foi, paquita?
- Eu sou Olavo, dono do Telegrama.
- Sinto muito.
- Tá ruim, eu sei. A Kátia Kelly, essa aí que chama as pessoas, é fraquinha mesmo. É que eu conheci ela num forró, quando eu tocava no Cueca Melada, e prometi que ia fazer ela ficar famosa. Era papo só pra pegar, sabe?, mas aí depois..
- Amigo. Pára. Tá me embrulhando o estômago.
- Desculpa. Mas então. Você é muito simpática, engraçada, espirituosa. Quer o emprego?
- Tá de sacanagem?
- Não.
- Isso faz parte do telegrama? Tipo... é a parte do susto, da pegadinha?
- Prometo que é verdade.
- Nem fudendo.
- 50 por telegrama.
- Tô fora, paquita.
- 55?
- Cara... de boa. Sai daqui.
- 60?
- Some. Vaza.
- Tá. Tô indo.

Ele já passava do portão quando ela gritou.

- Ô, paquita!
- Oi?

- Hehe. Olhou.

By Redatoras de merda.

Um comentário:

. fina flor . disse...

kkkkkkk, eu nem teria saído de casa, kkkkkkk

beijos, querida

MM.